terça-feira, 1 de novembro de 2016

Crítica: ‘Dobrando a Carioca’ faz estudo da história do samba e de seus participantes

Disco traz encontro de Zé Renato, Jards Macalé, Guinga e Moacyr Luz



RIO — Lançado agora em CD e DVD (Biscoito Fino), o encontro no palco entre Zé Renato, Jards Macalé, Guinga e Moacyr Luz — nascido em 1999 para o belo projeto “Seis e meia”, do Teatro João Caetano, e remontado no ano passado, quando foi gravado no Sesc Ginástico — traz nele muito mais do que as quatro trajetórias. No espetáculo, há a reunião de quatro olhares sobre a música brasileira — e, mais especificamente, sobre o samba. Quatro vozes, quatro violões, quatro repertórios costurando o passado e os presentes do samba.

Os quatro caminhos têm como ponto de intercessão o fato de serem traçados por artistas que — apesar de terem sucessos comerciais marcantes no currículo — sempre se pautaram pela independência. Jards visita a tradição de forma anárquica, Guinga reconstrói essa tradição em catedrais completamente novas, Moacyr carrega o fundo dos quintais suburbanos em harmonias litorâneas, Zé Renato é um cultor da beleza apolínea. Juntos, eles se propõem, sem bandeiras, a pisar no chão comum do samba, conversando a partir de diferenças e semelhanças.

Muitas vozes são puxadas para a roda: Pixinguinha (“Um a zero”, com letra de Nelson Angelo), Padeirinho (“Favela”), Zé Ketti (“Nega Dina”), Jackson do Pandeiro (“Como tem Zé na Paraíba”) e Moreira da Silva (“Acertei no milhar”). Há ainda as canções-tributo de Moacyr e Aldir (“Cachaça, árvore e bandeira”, para Carlos Cachaça, e “Anjo da Velha Guarda”, para os mestres das escolas). A história do samba sendo costurada declarada ou insinuadamente (como samba-choro ancestral e novíssimo “Picotado”, de Guinga).

Guinga, Jards Macalé, Moacyr Luz e Zé Renato retomam projeto de 1999 em novo CD e DVD - Divulgação/ Marluce Martins


Apesar de os quatro serem violonistas, é rara a redundância. Guinga assume o papel de comentar ao instrumento quando um dos outros está à frente (como em “Cidade lagoa”, em “Cachaça, árvore e bandeira” ou no solo em “Vapor barato”, a que Macalé assiste rindo de admiração). Macalé faz solo de trombone com a boca e toca até penico. Zé Renato é o percussionista principal (“o melhor pandeirista do Leblon”, zoa Guinga), além de dar a pureza de sua voz para melodias como “Você, você” e “Anjo da Velha Guarda”. Moacyr é o centro de gravidade, talvez o que melhor consiga transitar entre os quatro universos — os do samba, enfim. Como ele canta: “Folha sagrada onde o morro reescreve/ A história do seu povo/ Mas essa é verdadeira’’.


Cotação: Bom.

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