Cantor diz que passou uma pernada em Chico Buarque com divulgação de seu samba em Marte
Jorge Aragão na gravação do DVD
Foto: Divulgação |
Rio - Na gravação
do DVD da quinta edição do ‘Samba Book’, dedicado à sua obra (e que chega a
público num show com convidados no Vivo Rio, em 26 de julho), Jorge Aragão foi
bastante fotografado. Clicou bastante também: volta e meia tirava sua Nikon da
bolsa e saía pegando imagens de todos os artistas convidados — um time que
inclui Fundo de Quintal, Diogo Nogueira, Zeca Pagodinho, Anitta e Beth
Carvalho. Como se não bastasse ter sido o único sambista a ser ouvido em Marte
(em 2001, uma missão da Nasa no planeta levou até lá um veículo robotizado que
executava seu sucesso ‘Coisinha do Pai’), o cantor, que completa 40 anos de
carreira graças à gravação que Elza Soares fez de ‘Malandro’, parceria sua com
Jotabê, é fissurado por fotografia e badulaques eletrônicos.
“Tenho uma máquina
que consegue até pegar buracos na lua. Fico no meu apartamento na Avenida Lúcio
Costa (Barra da Tijuca) e fotografo os navios no mar, pego muita coisa”, diz
Jorge. Após sair de qualquer compromisso, ele coloca seus dois celulares e
plugados no carro: usa um para o aplicativo Waze e o outro deixa ligado no
TuneIn, para ouvir rádios online de todo o mundo. Diz nunca ter deparado com
sua música tocando em uma rádio de outro país. “Ih, rapaz, se isso acontecer
vou ter um troço”. Quanto à execução de ‘Coisinha do Pai’ em Marte, Jorge
revela que não recebeu nada por isso. Nem sabe se Almir Guineto e Luiz Carlos
da Vila, parceiros na música, ganharam direitos.
“Um amigo falou
para botar advogado no meio, acho que a Beth Carvalho (que gravou a música em
1979) botou a boca no trombone... Soube da música em Marte quando vi na
televisão”, conta. “Eu nunca vou ser uma poeirinha do Chico Buarque como
compositor, mas com ‘Coisinha do Pai’ eu dei uma pernada nele! Eu já toquei em
Marte e ele não!”, brinca.
Para um compositor
plugado, um projeto multiplataforma: criado pela Musickeria, o ‘Samba Book’,
como ocorreu nas edições anteriores, tem CD duplo, DVD, Blu-Ray, especial de
TV, livro com discografia comentada, partituras, ambiente web com redes sociais
e aplicativos. O repertório do DVD inclui seu primeiro sucesso, ‘Malandro’,
reinterpretado por Baby do Brasil. Emicida põe novo balanço no verso “respeite
quem soube chegar aonde à gente chegou” de ‘Moleque Atrevido’, Anitta
sensualiza em ‘Coisinha do Pai’, Elza surge no hino antirracista ‘Identidade’,
Martinho da Vila canta ‘Coisa de Pele’. Alcione recria ‘De Sampa a São Luiz’.
Nos extras do DVD, Beth Carvalho, que canta ‘Pedaço de Ilusão’, revela ter dado
uma esnobada em Jorge quando o conheceu (“não prestei atenção nele, estranho,
né?”, diz); e Maria Rita (que canta ‘Do Fundo do Nosso Quintal’) chora ao dar
depoimento sobre o sambista.
“Ela chorou
mesmo?”, pergunta impressionado. “Rapaz, nem vi os extras ainda. Mas todo mundo
arrebentou. A Anitta me falou do quanto ‘Coisinha do Pai’ é importante para
ela, que tem a ver com a história dela com os pais. Foi uma música que fiz para
minhas filhas. ‘Vou Festejar’ também não fiz para a Beth Carvalho (que a
gravou). Foi tudo pra mim. Sempre fiz o que gostava. Meu samba não é cartão de
crédito”. Jorge já vem compondo músicas novas, sozinho e com parceiros como
Leandro Lehart, mas revela que o que faz sucesso mesmo são sambas seus feitos
há quatro décadas. “Toco ‘Malandro’ e muita gente acha que ela foi feita agora.
Já aconteceu de eu chegar num show e falar: ‘Não tenho nada novo pra
apresentar, só esses sambas aqui de 40 anos atrás...’ e todo mundo: ‘Êêêêê!’”,
brinca.
As emoções do DVD
foram fortes, mas Jorge se cuida. Após um enfarte agudo em 2014,o cantor, que
tem 67 anos, frequenta o médico e faz exercícios. Na época, fez operação e pôs
stents. “Poderia ter sido fatal, mas fui atendido rapidamente e não tive
sequelas. Depois de uma operação dessas, você ganha uma maneira nova de ver a
vida. Hoje quero estar perto de pessoas que me tragam algo de bom.”
Um sambista nos
bailes
Jorge Aragão, a 40
anos, de calça boca de sino, juba black, magrinho, tocando guitarra. Imaginou a
cena? Pois é, aconteceu: antes de ‘Malandro’ estourar na voz de Elza Soares, o
sambista era músico de baile e dividia seu tempo entre o cavaquinho, o violão e
a guitarra. Tinha fama de bom guitarrista, inclusive — e segundo testemunhas,
tirava todos os solos de Jimi Hendrix. “Eu adorava Wes Montgomery (guitarrista
americano de jazz). Na época, o Jotabê (parceiro em ‘Malandro’) fazia baile
comigo e me passava a melodia na Kombi que nos levava para as festas, cantando
‘lá lá lá’. Eu tirava tudo na hora”, conta Jorge. Naquele tempo, bem antes de
entrar para o Fundo de Quintal (ao qual pertenceu na década de 80) e sem nem
sonhar em se tornar cantor solo de sucesso, usava uma roupa toda verde. “Eu era
tão magro que parecia um louva-a-deus”, brinca. Hoje Jorge nem tem guitarra em
casa e prefere usar violão elétrico, mas diz que as lições desse período
ficaram até hoje. “Eu já gravei as ‘Bachianas’ de Heitor Villa-Lobos, gravei em
português ‘Can’t Take My Eyes Off You’ (sucesso do grupo americano Frankie
Valli & The Four Seasons, que com Jorge virou ‘O Céu Nas Mãos’)... Nem é
para provocar os defensores das raízes do samba, mas é para mostrar uma outra
face minha”.
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